Produtor troca venda de motosserra por lucro com créditos de carbono

Novo modelo de parceria rural prevê cultivo de árvores nativas sem custo para o proprietário e remuneração pelo compromisso de não desmatar O pecuarista Sadir Schmid migrou do Paraná para a floresta amazônica na década de 1980, chegou a vender motosserras para a derrubada de árvores e abertura de pastagens, e nos últimos tempos - com solo degradado, baixa produtividade e alto custo do gado - vivia o dilema de arrendar a fazenda de 666 hectares para a produção de dendê, em Tomé-Açu (PA). A trajetória do produtor não seria diferente de muitos na região, não fosse a oportunidade de repor o que foi destruído e buscar no mercado de carbono a garantia de aposentadoria e renda para novas gerações da família, sem abrir mão das terras. Veja também: “É alta a expectativa para essa diversificação de receita”, afirma Schmid, com 266 hectares de mata em recuperação. Na fazenda Três Irmãos, o proprietário integra um novo modelo de parceria rural, no qual destina uma área ao cultivo de árvores nativas sem arcar com os custos, se compromete a não desmatar e é remunerado pela distribuição dos lucros referentes à venda de créditos de remoção de carbono. A iniciativa, recém-lançada pela empresa de restauração florestal Mombak, prevê rendimentos entre R$ 500 e R$ 1 mil por hectare ao ano: três a cinco vezes mais que a renda da pecuária de baixa intensidade, predominante na região amazônica. Há, ainda, a possibilidade de exploração de recursos não madeireiros no futuro, como cacau, castanha, açaí e ingá. Os contratos rendem lucros por até cem anos, com adiantamento de valores por cinco anos durante o crescimento das árvores. Adotado em áreas de no mínimo 100 hectares, o modelo ajuda a sanar o déficit de reserva legal, comum em fazendas na Amazônia, onde imóveis localizados em florestas devem apresentar entre 50% e 80% de cobertura vegetal nativa. “A parceria com produtores rurais gera maior resultado do que a compra de áreas próprias para reflorestamento pela empresa e permite capturar a mesma quantidade de carbono com menos capital”, explica Thomas Oldham, CIO da Mombak. No momento, há duas parcerias em operação na Amazônia e cerca de 50 estão em negociação, no plano de fazer o modelo representar dois terços das áreas reflorestadas pela empresa no futuro. “O envolvimento com fazendeiros que operam há muito tempo na região gera segurança às operações”, argumenta o executivo da companhia. A Mombak possui fazenda própria de carbono no município de Mãe do Rio (PA), onde até agora plantou 3 milhões de árvores em 3.000 hectares. Neste ano, o plano é atingir 10 mil hectares, incluindo as parcerias rurais, com injeção de novos investimentos. Além de US$ 120 milhões de fundos de pensão para as atividades iniciais, e US$ 36 milhões do Banco Mundial, a empresa teve R$ 160 milhões aprovados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), em agosto. Os recursos deverão ser aplicados na região amazônica de maior impacto do desmatamento. “A maior escala é essencial diante do cenário climático”, enfatiza Oldham. O mercado global de créditos de remoção de carbono retira da atmosfera entre 3 milhões e 5 milhões de toneladas ao ano, segundo dados da empresa. O aumento das parcerias rurais com fazendas de grande porte poderia capturar pelo menos 100 milhões de toneladas de carbono ao ano no mundo. Agricultura familiar A demanda chegou à agricultura familiar. Com operações no Pará e mais quatro Estados, a startup Belterra, voltada à restauração de áreas degradadas com sistemas agroflorestais, busca no mercado climático recursos para expandir projetos com pequenos e médios produtores que consorciam a produção de cacau, açaí e outros alimentos à recuperação e conservação de floresta. A empresa entrou na certificadora Verra com o registro de 1,4 milhão de créditos de carbono. “Com as mudanças climáticas, o sistema agroflorestal deveria ser o novo normal da agricultura”, ressalta Valmir Ortega, diretor-executivo da Belterra. O negócio desenvolveu arranjos com produtores, prevendo tanto o arrendamento de uma parte da área por 15 anos como a parceria rural em que o proprietário entra com a terra e recebe insumos e assistência para acesso a crédito ou capital visando implantar ou ampliar florestas produtivas. Cerca de 400 agricultores participam da parceria e outros 300 deverão se engajar até o fim do ano, principalmente na Amazônia, segundo Ortega. “Com baixa produtividade, produtores descapitalizados não conseguem recuperar áreas degradadas”, afirma. Há cinco anos, após receber investimento de R$ 12 milhões do Fundo Vale para modelar a estratégia de reflorestar 100 mil hectares no país com impacto social positivo, a Belterra concebeu métodos de criar agroflorestas em larga escala com capacidade de remunerar investidores. Até 2024, a empresa recebeu cerca de R$ 100 milhões de diferentes fundos, no total de 5.000 hectares de agroflorestas, com meta de chegar ao dobro em 2026.

Produtor troca venda de motosserra por lucro com créditos de carbono
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